A Síndrome da Bicicleta Ergométrica – CRM
Por Alexandre Borges – www.bdirect.com.br Não conheço uma candidata melhor ao prêmio de inutilidade doméstica do que uma bicicleta ergométrica. A promessa é quase irresistível: você em forma rapidamente, fazendo um exercício aeróbico de baixo impacto, dentro de casa, na hora que quiser, vendo TV, folheando o jornal, de frente para a varanda, falando ao telefone, lendo um livro, ou tudo isso junto. É o exercício perfeito para quem não tem tempo, paciência, hábitos esportivos, nem opções viáveis ao ar livre. Lembro disso toda vez que escuto falar sobre mais um sistema de CRM que não deu certo, sempre mais caro, mais demorado e com menos resultados do que se previa. Acreditar que um pacote de softwares pode resolver o relacionamento de uma empresa com seus clientes é achar que basta comprar uma bicicleta parada para resolver seus problemas de forma física. E tanto a bicicleta quanto o pacote milionário de softwares acabam do mesmo jeito. Ficam lá, encostados, sem uso, lembrando a você do enorme desperdício de tempo e dinheiro que você teve. Antes de comprar qualquer sistema, responda sinceramente: você está preparado para se relacionar diretamente com seus clientes? Você considera a ligação para o SAC uma oportunidade única de conhecer seu cliente ou um custo incômodo que tem que ser cortado mês a mês? Qual a velocidade com que você quer responder a qualquer solicitação, sugestão ou reclamação? Como você lida com pedidos de troca, devolução ou insatisfação com seus produtos? Se sua empresa quer ter ferramentas para identificar seus clientes como indivíduos, ela tem que saber lidar com indivíduos. E isso não é um software que resolve. Tenho visto muitas empresas que desprezam seus consumidores em relação às planilhas. São as empresas que chamo de bidimensionais. Elas acham que seu negócio cabe numa tabela de despesas e receitas e esquecem que cada consumidor é muito mais complexo do que isso. Consumidores, evidentemente, são tridimensionais. O caminho é sempre o mesmo: a empresa tem o controle de todas as linhas de produtos e percebe que uns dão mais lucro do que outros. O que se faz? Retira-se o produto menos lucrativo para aumentar a rentabilidade, certo? Errado. No raciocínio bidimensional, o consumidor é uma mera abstração. Tirar produtos da linha, por exemplo, levando-se em conta apenas a margem deste produto, e não do conjunto de produtos que o consumidor com uma determinada característica compra, seria ótimo se não fossem o João, a Marlene, o Lucas, a Flávia, que compram mais de um produto de cada vez e querem encontrar todos os produtos que estão procurando. Mas o João, a Marlene, o Lucas e a Flávia não aparecem na planilha. Alguém pode imaginar um restaurante que não serve água por que é um produto de menor rentabilidade que o Parmentier de Pernil de Cordeiro? Na planilha, se a água fosse “descontinuada” (eufemismo da moda), a rentabilidade aumentaria. Mas, na vida real, como fica o restaurante que não serve água? É o que Rust, Zeithaml e Lemon, em “O Valor do cliente” (Ed. Bookman), chamam de “Espiral da Morte”. Segundo eles, empresas orientadas a produtos, e não a consumidores, fazem isso o tempo todo, abrindo buracos no seu portfolio de produtos ou na sua prestação de serviços, o que abre uma porta de entrada para um concorrente mais focado na necessidade daquele grupo de consumidores. Resultado: menos clientes, menos escala, menor rentabilidade geral dos produtos, mais produtos retirados do portfolio até que a Espiral da Morte sufoca a empresa, que não tem outra saída a não ser fechar as portas. Empresas voltadas ao consumidor se preocupam com a satisfação de necessidades de clientes. São empresas que descobriram que o que diminui a pressão sobre as margens, aumenta a rentabilidade e bloqueia a entrada de concorrentes é a satisfação das necessidades dos clientes. Os sistemas de CRM, nome cada vez mais em desuso, só são úteis quando usados para identificar grupos de consumidores estatisticamente relevantes e desenhar produtos, serviços e processos para atender as suas demandas. Toda vez que você for abordado por uma oferta de sistemas caros e complexos que “resolverão tudo”, lembre que nenhum software do mundo diria para o Comandante Rolim estender um tapete vermelho para seus clientes.
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